Conceitos
- Tuberculose primária: doença pulmonar ativa, devida à primoinfecção por Mycobacterium tuberculosis. É a forma mais comum em crianças;
- Tuberculose secundária: doença pulmonar ativa em paciente previamente sensibilizado por M. tuberculosis (reativação ou reinfecção), predominante em adultos e adolescentes;
- Tuberculose miliar: forma grave de tuberculose, predominante em imunocomprometidos;
- Tuberculose extrapulmonar: forma que predomina em imunocomprometidos e na infecção congênita.
Epidemiologia
- A tuberculose é um dos problemas prioritários de saúde pública no Brasil, que é o 3º país no mundo com maior carga de tuberculose (burden of disease).
- Doença infecciosa que mais mata no mundo.
- 80% dos óbitos em crianças e adolescentes ocorrem abaixo dos 5 anos. Em 96% desses casos, não houve acesso ao tratamento.
- Em crianças e adolescentes, predomina a forma pulmonar.
- Grupos mais vulneráveis:
- Imunossuprimidos;
- Pessoas privadas de liberdade;
- Indígenas;
- Habitantes de comunidades.
Fisiopatologia
- Causada pelo M. tuberculosis (bacilo de Koch). Trata-se de um bacilo álcool-ácido resistente (BAAR).
- O M. tuberculosis se aloja especialmente nos macrófagos.
- O bacilo é transmitido por gotículas respiratórias, e inativado pela exposição à luz ultravioleta.
- Sequência da infecção:
- Reação inflamatória alveolar inespecífica;
- Multiplicação bacilar nos alvéolos;
- Migração dos bacilos para os linfonodos (nódulo de Gohn);
- Disseminação hematológica (em alguns casos);
- Resposta linfocitária do hospedeiro (imunidade celular).
- Após a infecção, pode ocorrer:
- Eliminação: clearance do bacilo;
- Infecção latente (sem sintomatologia);
- Doença ativa: desenvolvida em sua forma primária alguns anos após a exposição;
- Reativação: doença ativa muitos anos após a exposição.
- Transmissão depende de:
- Carga bacteriana do infectado;
- Ventilação e exposição solar do ambiente;
- Tempo de contato;
- Proximidade do contato.
Diagnóstico
Critérios de suspeita
- Febre:
- Prolongada;
- < 38,5ºC;
- Vespertina;
- Duração ≥ 15 dias;
- Tosse persistente por mais de 3 semanas;
- Perda de peso;
- Anorexia;
- Astenia;
- Sudorese noturna;
- Linfadenomegalias:
- Cervical (principalmente);
- Supraclavicular;
- Axilar;
- Mediastinal.
Crianças abaixo de 10 anos
- São paucibacilares (desenvolvem quadros inespecíficos, bacilos escassos).
- Diagnóstico feito por escores.
Crianças acima de 10 anos e adolescentes
- Podem ser bacilíferos, com quadro semelhante ao de adultos.
- Diagnóstico feito por exames microbiológicos, com escores apenas como alternativa.
Propedêutica
- Deve ser realizada com o paciente e seus contatos.
- RX de tórax:
- Linfadenomegalia mediastinal;
- Pneumonia resistente a antibioticoterapia.
- Prova tuberculínica:
- Inoculação intradérmica e leitura após 48-72 h: diâmetro transverso da enduração palpável;
- Considerada positiva quando ≥ 5 mm;
- Positiva após 2-12 semanas da infecção;
- Continua positiva após o tratamento dos doentes;
- Falso negativo:
- Desnutrição;
- Imunodepressão;
- Infecções virais;
- Neoplasias.
- Exames de escarro: menos eficazes em crianças, pois têm dificuldades de escarrar (escarro induzido tem elevado risco de transmissão), e a sensibilidade também é diminuída por elas serem paucibacilares.
- Baciloscopia: diagnóstico e controle de tratamento;
- Cultura: altamente sensível e específica no diagnóstico.
- Lavados: métodos invasivos, que podem ser úteis em situações específicas.
- Teste rápido molecular: detecta o M. tuberculosis e tria cepas resistentes à rifampicina, devendo ser realizado em adolescentes e adultos, mas não em crianças, que são paucibacilares.
- IGRA: avalia níveis séricos de interferon induzido por antígenos de M. tuberculosis. Não está disponível na rede pública.
Escore para diagnóstico (Ministério da Saúde)
Pontuação | Quadro clínico | Padrão radiológico | Contato com adulto com tuberculose | Prova tuberculínica | Peso |
---|---|---|---|---|---|
+ 15 | Febre ou sintomas como tosse, adinamia, expectoração, emagrecimento, sudorese por ≥ 2 semanas | Adenomegalia hilar ou padrão miliar e/ou condensação ou infiltrado (com ou sem escavação) inalterado por ≥ 2 semanas, sem melhora com antibioticoterapia | |||
+ 10 | Próximo, nos últimos 2 anos | ≥ 10 mm | |||
+ 5 | Condensação ou infiltrado de qualquer tipo por menos de 2 semanas | 5-9 mm | Abaixo do percentil 10 (desnutrição grave) | ||
0 | Assintomático ou com sintomas há menos de 2 semanas | Ocasional ou ausente | < 5 mm | ≥ percentil 10 | |
– 5 | Normal | ||||
– 10 | Infecção respiratória com melhora após antibioticoterapia |
- 40 pontos: tuberculose muito provável, iniciar tratamento;
- 30-35 pontos: tuberculose possível, orienta início do tratamento a critério clínico;
- < 30 pontos: tuberculose pouco provável.
Profilaxia
Forma mais eficaz é a quimioprofilaxia.
Profilaxia primária
- Previne a infecção do recém-nascido coabitante de caso-índice bacilífero.
- Conduta: uso por 3 meses, de rifampicina ou isoniazida. Se a prova tuberculínica for ≥ 5 mm após esse período, a medicação será mantida por mais 1 (rifampicina) ou 3 meses (isoniazida).
- BCG deve ser realizada apenas após a negativação do teste tuberculínico.
- Amamentação não está contraindicada caso a mãe seja caso-índice, exceto caso tenha mastite tuberculosa, mas ela deve utilizar máscara cirúrgica ao fazê-lo.
Profilaxia secundária
- Previne a manifestação da infecção latente naqueles que já estão infectados.
- É obrigatória em crianças, e deve ser ponderada em caso de adolescentes conforme riscos e benefícios.
- Conduta: 9-12 meses de isoniazida ou 4 meses de rifampicina
Tratamento
- Ocorre em 2 fases: ataque (eliminação do maior número possível de bacilos) e manutenção (eliminação de população resistente de bacilos).
- Abaixo de 10 anos:
- Ataque: 2 meses de rifampicina, isoniazida, e pirazinamida;
- Manutenção: 4 meses de rifampicina e isoniazida.
- Acima de 10 anos:
- Ataque: 2 meses de rifampicina, isoniazida, pirazinamida, e etambutol;
- Manutenção: 4 meses de rifampicina e isoniazida.
Seguimento clínico
- Ajustar esquema terapêutico conforme ganho de peso;
- Baciloscopia mensal (adolescentes);
- Controle radiológico (2º mês e final do tratamento);
- Desnutrição;
- Diagnóstico de coinfecção por HIV;
- Drogas (álcool).
Referência(s)
Aulas das professoras Cristina Botelho Barra e Laís Meirelles Nicoliello Vieira.