Introdução ao sistema digestório
Composto por uma sequência de órgãos tubulares ocos de parede muscular conectados anatomicamente. Histologicamente, são formados por camadas mucosa, muscular da mucosa, submucosa, muscular própria, e serosa. Já a estrutura e a forma dos órgãos adaptam-se às suas respectivas funções especializadas.
Doença isquêmica intestinal
Assim como o coração, o intestino é um órgão de funcionamento constante, que precisa de constante suprimento de sangue. A doença isquêmica ocorre quando a demanda torna-se maior que o suprimento.
Seus fatores predisponentes incluem:
- Idade avançada;
- Diabetes;
- Tabagismo;
- Aterosclerose grave das artérias aorta ou mesentérica;
- Cardiopatias formadoras de trombos ou com redução do débito cardíaco (e, portanto, da perfusão dos intestinos).
Angina intestinal
Trata-se de isquemia crônica, que manifesta-se com dor abdominal intermitente pós alimentar devido à maior demanda metabólica do intestino. Não há necrose.
Infarto intestinal
Ocorre interrupção do fluxo sanguíneo para uma porção intestinal, causando necrose. Tem letalidade de 40-70%.
A necrose pode ocorrer apenas na mucosa ou abranger todas as camadas da parede intestinal (infarto transmural), o que se determina pela intensidade e pela duração da isquemia.
Devido à configuração da irrigação nesses órgãos, no intestino delgado, as áreas mais acometidas são o jejuno distal e o íleo. Já no grosso, é a flexura esplênica.
A maioria dos infartos ocorre por redução ou interrupção do fluxo sanguíneo arterial, especialmente da artéria mesentérica superior, por fenômenos tromboembólicos, mas alguns ocorrem por redução ou interrupção do fluxo sanguíneo venoso (trombose das veias mesentéricas), visto que a interrupção da drenagem venosa dificultará o fluxo de sangue arterial. Isso costuma ocorrer por congestão na insuficiência cardíaca, inflamações abdominais, e cirurgias abdominais.
Na ausência de obstrução arterial ou venosa, um infarto intestinal pode ocorrer por baixa perfusão sistêmica (choque hipovolêmico, desidratação, hipotensão arterial, insuficiência cardíaca) ou compressão mecânica externa ao fluxo sanguíneo (intussuscepção, vólvulo, hérnias).
As manifestações sintomáticas do infarto intestinal transmural incluem:
- Dor abdominal periumbilical súbita e intensa;
- Taquicardia;
- Hipotensão arterial;
- Náusea e vômitos;
- Diarreia sanguinolenta;
- Redução ou abolição dos movimentos peristálticos;
- Íleo adinâmico ou íleo tóxico;
- Peritonite.
Na macroscopia, há sangue no lúmen intestinal, e os limites da necrose são mais nítidos em infartos arteriais. Já na microscopia, visualiza-se necrose isquêmica e inundação hemorrágica da área. As lesões são visíveis de 15-18 hrs após o início da isquemia, e o infiltrado inflamatório aparece apenas no 2º dia após o infarto.
Consequências e complicações possíveis são choque hipovolêmico, em decorrência da hemorragia digestiva baixa, e peritonite (ou septicemia), em consequência da permeabilização da alça intestinal necrótica e da proliferação bacteriana que ocorre com a cessação do peristaltismo.
Doença inflamatória intestinal (DII)
São duas inflamações crônicas idiopáticas, de caráter recidivante. O quadro clínico de ambas é semelhante: febre, dor abdominal em cólicas, e diarreia de evolução prolongada por anos ou décadas. Cada uma delas tem história natural, resposta terapêutica, e evolução distintas. Ambas, porém, causam frequente recomposição da mucosa intestinal, com proliferação celular em um ambiente hostil, determinando uma condição pré-cancerosa. Membros da mesma família podem ter as duas formas da DII.
A etiologia das DII é incerta. Acredita-se que fatores genéticos, microbiológicos, e imunitários tenham papel. Certos genes favorecem a persistência intracelular de microrganismos da microbiota intestinal, que agem como antígenos. O sistema imune responde com inflamação exagerada e destrutiva ao TGI, mediada por linfócitos T e CD4+.
Com o tempo, a mucosa perde sua função absortiva. Os pacientes podem ter diarreia mucossanguinolenta protraída e debilitante.
Doença de Crohn (DC)
Acomete predominantemente brancos (em especial, judeus) e mulheres. Os pacientes costumam ser diagnosticados entre 20-40 anos. Qualquer região do TGI é vulnerável à DC, sobretudo o íleo terminal, o ceco, e o cólon ascendente.
Macroscopicamente, as lesões (ulcerações lineares, fissuras) são bem demarcadas, salteadas, segmentares, intercaladas com segmentos normais, e transmurais. As áreas de mucosa preservada formam elevações em aspecto de “pedra de calçada”.
A parede intestinal fica espessada por fibrose (processo cicatricial), gerando estenose segmentar. As ulcerações podem formar fístulas, que podem evoluir com formação de aderências entre as alças intestinais e com outros órgãos.
Microscopicamente, há inflamação transmural com destruição tecidual. Forma-se granulomas sem necrose caseosa, úlceras lineares e profundas na mucosa, formando fissuras, e estenose segmentar.
As fístulas e aderências podem evoluir para abcessos, peritonites, e septicemia. Além disso, a má absorção intestinal num geral pode causar desnutrição, deficiência de vitamina B12, e anemia. Por fim, 3% dos casos desenvolvem adenocarcinoma colônico.
Retocolite ulcerativa crônica (RCUC)
Predomina em pacientes brancos (especialmente judeus), sem diferença de sexo. O diagnóstico também é entre 20-40 anos.
As lesões iniciais ocorrem no reto e no sigmoide, com progressão retrógrada (em sentido proximal) e contínua (não segmentar). Em casos graves, chega ao nível de pancolite e ileite. Afeta a mucosa e a submucosa (úlceras rasas), sem reação granulomatosa ou fibrosante.
Os pacientes desenvolvem diarreia mucopiosanguinolenta intensa e prolongada, cursando com distúrbios eletrolíticos e anemia, cuja gravidade varia conforme a intensidade da inflamação e a extensão do acometimento intestinal. É uma condição pré-cancerosa ainda mais perigosa que a DC. O alto turnover celular predispõe à formação de displasias que evoluirão para câncer.
Úlcera péptica
Lesão ulcerada causada pela digestão da mucosa e/ou de outras camadas da parede de órgãos do TGI pela secreção cloridropéptica presente no suco gástrico. Ocorre no estômago (principalmente curva antral) e no duodeno (principalmente bulbo duodenal).
Independentemente da localização, pode haver hemorragia digestiva alta (HDA). Todavia, apenas a úlcera péptica gástrica (UPG) pode causar malignidade. Além disso, o tratamento do H. pylori nem sempre resolve a UPG, mas costuma resolver a úlcera péptica duodenal (UPD).
Em condições fisiológicas, há equilíbrio entre o meio gástrico ácido e as defesas do indivíduo (muco, prostaglandinas, etc). Na UPD, pesa mais o aumento de fatores de agressão, enquanto na UPG pesa mais a perda de fatores de defesa. Em ambos os casos, a H. pylori é um importante agente etiológico.
Na úlcera, além de erosão do tecido, há tecido de granulação e fibrose na região escavada. Em casos graves, pode haver perfuração completa, e peritonite por suco gástrico. Nesses casos, o organismo pode mover as estruturas do abdome para tamponar (“tampar”) a úlcera e evitar a perfuração. Consequentemente, as manifestações clínicas incluem HDA, perfuração, obstrução (no processo de cicatrização), e aderências.
Referência(s)
Aula da professora Mônica Demas.