Cardiopatia isquêmica: anatomia patológica

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É uma doença de alta prevalência e potenciais gravidade e letalidade. Ao considerar a população mundial como um todo, trata-se da mais frequente causa de mortalidade.

Circulação coronariana

Temos 2 artérias coronárias (direita e esquerda), ambas originadas da aorta nos seios de Valsava. A artéria coronária esquerda tem como ramos principais a artéria descendente anterior e a artéria circunflexa. Já a coronária direita origina o ramo descendente posterior. Ambas geram também ramos marginais.

De forma geral, a coronária esquerda nutre as faces anterior e lateral esquerda do coração, enquanto a direita nutre a posterior e a lateral direita.

A irrigação do miocárdio é feita do epicárdio em direção ao endocárdio. Dessa forma, a região subendocárdica costuma ser a primeira a sofrer com os efeitos danosos da isquemia.

No início da vida, os ramos coronarianos são terminais. No entanto, ao longo da vida surgem anastomoses dos ramos principais delas, formando uma rede de circulação colateral. Ela desenvolve-se principalmente quando há maior demanda por irrigação pelo miocárdio e/ou obstruções em outras partes do sistema coronariano. Há, portanto, grande capacidade de adaptação da circulação coronariana. A oferta e a demanda de irrigação pelo miocárdio existem em um estado de equilíbrio dinâmico, conforme as variações do “trabalho” do miocárdio.

Etiopatogênese

Em situações normais, a oferta de sangue ao miocárdio é maior ou igual à demanda. A isquemia ocorre sempre que a oferta é menor que a demanda. Ela pode ocorrer, portanto, por redução da oferta e/ou aumento da demanda.

Redução da oferta de sangue

É causada, na maioria das vezes, por aterosclerose, que pode ocluir vasos por ateromas, trombos (especialmente comuns em placas instáveis), espasmos, e/ou hemorragias. Esses fenômenos são relacionados entre si, de modo que a presença de um aumenta a probabilidade de ocorrência simultânea de outro.

Além da aterosclerose, a redução de oferta de sangue também pode ocorrer por embolia coronariana (pouco frequente) e/ou outras coronariopatias.

Aumento da demanda de sangue

Pode ocorrer de forma aguda ou crônica.

No aumento agudo, a causa é a sobrecarga, seja física ou emocional, que leva à resposta adrenérgica e a espasmos das artérias coronárias.

Já o aumento crônico é decorrente da hipertrofia do miocárdio, que leva a uma situação na qual o indivíduo já está vivendo no limite superior de adaptação do seu miocárdio.

Fatores de risco

Todos os fatores de risco da aterosclerose são, por consequência, fatores de risco para isquemia do miocárdio. Porém, alguns deles favorecem por si só essa patologia:

  • Hipertensão arterial (por levar à hipertrofia do miocárdio);
  • Tabagismo (por favorecer a formação de trombos);
  • Sedentarismo (por não estimular o desenvolvimento de circulação colateral);
  • Obesidade (por sobrecarregar patologicamente o miocárdio).

Além desses, também é importante fator de risco qualquer patologia que leve à hipertrofia do miocárdio.

Formas de manifestação

Angina do peito (angina pectoris)

É a condição clínica caracterizada por dor torácica precordial súbita, aguda, intensa, em “pontada”, que pode irradiar-se para o pescoço e membro superior, causada por isquemia transitória do miocárdio.

Apresenta-se sob três formas: angina de esforço (estável, clássica), angina de repouso (Prinzmetal), e.angina instável (em crescendo).

A angina de esforço caracteriza-se pela ausência de sintomas em situações normais, com a dor surgindo apenas em situações de sobrecarga física ou emocional. Da mesma forma, a dor é aliviada quando a situação de sobrecarga passa. A maioria dos pacientes tem aterosclerose comórbida.

Já na angina de repouso, o indivíduo tem sintomas mesmo que não tenha havido uma situação de gatilho. Nesse caso, é causada por espasmos causados por aterosclerose.

Por fim, a angina instável é caracterizada pelo encurtamento do período entre crises e prolongamento de sua duração. Além disso, estímulos cada vez menores são capazes de desencadear crise. É frequentemente causada por trombos não oclusivos na aterosclerose, e está associada a alterações concomitantes no endotélio. Faz parte da chamada síndrome coronariana aguda, de mau prognóstico.

Trombo não oclusivo em artéria com aterosclerose.

Como a angina é caracterizada por uma isquemia transitória, não costuma haver morte das células miocárdicas, exceto em pontos discretos. Ela costuma, porém, ser a primeira manifestação de coronariopatia, o que justifica a realização de propedêutica para detectar outras alterações.

Síndrome coronariana aguda

Caracterizada por eventos (erosão/úlcera, hemorragia, trombose) agudos nas placas ateromatosas.

Infarto do miocárdio

É uma região de necrose isquêmica do miocárdio. Para que a isquemia resulte em morte celular, é necessário que a isquemia seja persistente (mais de 30 minutos).

A causa mais frequente é a aterosclerose. Na grande maioria dos infartos, há combinação de ateroma e trombose. Outras causas incluem espasmos, hemorragias, embolias, e outras condições.

Trombo ocluindo luz de vaso.

Existem dois tipos morfológicos de infarto: subendocárdico (compromete menos da metade da estrutura da parede ventricular) e transmural (compromete mais da metade da estrutura da parede ventricular). Os infartos começam, portanto, como infartos subendocárdicos.

Infartos podem acometer qualquer uma das paredes ventriculares ou o septo interventricular.

Morfologicamente, o infarto agudo do miocárdio é branco, podendo conter áreas hemorrágicas (pretas). Ao redor da área de necrose, pode haver um halo hiperêmico hemorrágico. Quando o infarto atinge o pericárdio, pode haver pericardite fibrinosa (membrana róseo-avermelhada). Quando o infarto é muito extenso, pode haver trombose parietal, presa à cavidade cardíaca. Microscopicamente, visualiza-se necrose de coagulação, infiltrado inflamatório, e tecido de granulação.

Infarto agudo do miocárdio.
Infarto agudo do miocárdio.
Infarto agudo do miocárdio.
Necrose de coagulação no IAM.
Infiltrado inflamatório em IAM.
Tecido de granulação no IAM.

Já o infarto antigo, como não há capacidade de regeneração do miocárdio, há formação de cicatriz. A parede afina, e pode haver formação de aneurisma cardíaco. Microscopicamente, é visível a cicatriz conjuntiva.

Infarto antigo.
Infarto antigo, com aneurisma cardíaco.
Cicatriz fibrosada em infarto antigo.

O diagnóstico é predominantemente clínico, por meio de sinais e sintomas como dor torácica, dispneia, sudorese, anormalidades no ECG (especialmente elevação no segmento ST, especialmente no infarto transmural), e elevação da troponina sérica.

Após o infarto, a reperfusão do miocárdio pode se dar espontaneamente. Terapeuticamente, pode-se realizar fibrinólise e/ou angioplastia (stent). Quanto antes a reperfusão for realizada, maior a chance de redução da extensão do infarto. Todavia, a reperfusão pode resultar em hemorragia, caso o sangue extravase para a área infartada.

Hemorragia em área infartada.

As consequências de um infarto incluem:

  • Arritmia cardíaca;
  • Insuficiência cardíaca:
    • Edema pulmonar;
    • Choque cardiogênico;
  • Ruptura da parede:
    • Parede livre;
    • Músculos papilares;
    • Septo interventricular;
  • Embolia;
  • Novos infartos.
Hemopericárdio em decorrência de IAM.
Ruptura da parede cardíaca por IAM.
Ruptura da parede cardíaca por IAM.
Ruptura dos músculos papilares por IAM.
Ruptura do septo interventricular por IAM.

Morte súbita

Quando ocorre por cardiopatia, decorre de isquemia intensa. Nesses casos, não costuma haver necrose, mas sim lesões que provocam arritmias graves.

Isquemia crônica

Ocorre quando o indivíduo tem um processo isquêmico, de qualquer etiologia, por um período prolongado. As lesões têm extensões variadas, de modo que as consequências e a sintomatologia variam.

Referência(s)

Aula do professor Geraldo Brasileiro Filho.


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