O tromboembolismo venoso (TEV) é uma importante complicação pós-operatória. Sua incidência total nos EUA é de 900 mil casos/ano. No Brasil, 50 mil casos/ano são atendidos no SUS, gerando um custo de 2,7 milhões de reais/mês.
É uma doença que pode complicar-se de forma aguda como tromboembolismo pulmonar (TEP) e de forma crônica como síndrome pós-trombótica, causando, respectivamente, alta letalidade e grande perda da qualidade de vida. Trata-se da principal causa de morte intrahospitalar, podendo chegar a 15% de letalidade em internados. Todavia, seu diagnóstico é fácil, e há prevenção e tratamento.
Fatores de risco
Os fatores de risco do TEV estão associados à tríade de Virchow, composta por:
- Lesão endotelial;
- Estase sanguínea;
- Alteração dos constituintes do sangue.
Para averiguar corretamente o risco de um paciente e indicar a profilaxia adequada, utiliza-se o score de Caprini, composto por 37 itens, cada um com um valor:
Item | Valor |
Idade entre 41-60 anos | 1 pt |
Cirurgia de grande porte realizada há menos de 1 mês | 1 pt |
Varizes de MMII | 1 pt |
História de DII | 1 pt |
Edema recorrente de MMII | 1 pt |
IMC > 25 kg/m2 | 1 pt |
IAM | 1 pt |
ICC | 1 pt |
Sepse há menos de 1 mês | 1 pt |
Doença pulmonar grave (incluindo pneumonia) há menos de 1 mês | 1 pt |
DPOC | 1 pt |
Gravidez ou puerpério | 1 pt |
História de aborto espontâneo recorrente ou inexplicável | 1 pt |
Uso de ACO | 1 pt |
Idade entre 60-74 anos | 2 pts |
Cirurgia de artroscopia | 2 pts |
Câncer (prévio ou presente) | 2 pts |
Cirurgia de grande porte de duração superior a 45 min | 2 pts |
Cirurgia laparoscópica de duração superior a 45 min | 2 pts |
Paciente confinado ao leito por mais de 72 h | 2 pts |
Imobilização de membro | 2 pts |
Acesso venoso central | 2 pts |
Idade superior a 75 anos | 3 pts |
História pregressa de TVP ou TEP | 3 pts |
História familiar de TVP ou TEP | 3 pts |
Fator V de Leiden positivo | 3 pts |
Protrombina 20210 A positiva | 3 pts |
Anticoagulante lúpico positivo | 3 pts |
Homocisteína sérica elevada | 3 pts |
Anticorpos anticardiolipinas elevados | 3 pts |
Trombocitopenia induzida por heparina | 3 pts |
Trombofilia (congênita ou adquirida) | 3 pts |
Artroplastia de MMII | 5 pts |
Fratura de pelve, coxa, ou perna há menos de 1 mês | 5 pts |
AVE há menos de 1 mês | 5 pts |
Politrauma há menos de 1 mês | 5 pts |
Lesão medular ou paralisia há menos de 1 mês | 5 pts |
Por meio desse score, os pacientes são estratificados em 3 grupos de risco, para os quais os riscos de eventos tromboembólicos sem profilaxia, em %, é:
Baixo (≤ 1 pt) | Moderado (2-3 pts) | Alto (≥ 4 pts) | |
TVP distal | 2 | 10-40 | 40-80 |
TVP proximal | 0,4 | 2-8 | 10-20 |
TEP sintomático | 0,2 | 1-8 | 5-10 |
TEP fatal | 0,002 | 0,1-0,4 | 1-5 |
Profilaxia
- Medidas não farmacológicas (profilaxia física e/ou mecânica):
- Movimentação ativa de MMII;
- Deambulação precoce;
- Uso de meias elásticas de média compressão até a coxa;
- Compressão pneumática intermitente.
- Medidas farmacológicas:
- Medicação deve ser iniciada 12 h antes da cirurgia e aplicada enquanto persistir o risco;
- Dabigatrana e rivaroxabana têm a vantagem de não precisarem de controle de PTTA, mas são mais caras;
- Medicações mais utilizadas:
- Enoxaparina;
- Deltaparina;
- Heparina não fracionada.
Baixo risco
Profilaxia física e/ou mecânica.
Risco moderado
Profilaxia física e/ou mecânica e farmacológica.
Alto risco
Profilaxia física e/ou mecânica e farmacológica (em doses elevadas).
Diagnóstico
Manifestações da trombose venosa profunda (TVP) incluem:
- Trajetos venosos visíveis (sinal de Pratt) (48,5% dos casos);
- Cianose (17,3% dos casos);
- Edema (86,7% dos casos);
- Dor à palpação da panturrilha (sinal de Moses) (69,7%);
- Dor à palpação dos trajetos venosos (63,3%);
- Dor à dorsiflexão do pé (sinal de Homans) (61,7%).
Entretanto, o exame clínico sozinho tem baixa acurácia diagnóstica (50%). Por isso, deve-se seguir o seguinte fluxograma para realizar o diagnóstico definitivo:
Escore de Wells
Trata-se de ferramenta para cálculo da probabilidade de um paciente estar com TVP, levando em conta os seguintes critérios:
Critério | Pontuação |
Sensibilidade dolorosa no sistema venoso profundo | 1 |
Aumento do volume de toda a perna | 1 |
Aumento de 3 cm na circunferência da panturrilha (medida a 10 cm abaixo da tuberosidade tibial) sintomática em relação à perna assintomática | 1 |
Edema compressível (sinal do cacifo) | 1 |
Veias colaterais não varicosas superficiais | 1 |
Neoplasia maligna ativa | 1 |
Paralisia, paresia, ou imobilização de MMII | 1 |
Imobilização no leito por mais de 3 dias ou cirurgia de grande porte nas últimas 4 semanas | 1 |
Diagnóstico alternativo mais provável que TVP | -2 |
A partir desse escore, os pacientes são classificados em:
- Baixa probabilidade clínica: 0 pontos;
- Moderada probabilidade clínica: 1-2 pontos.
- Alta probabilidade clínica: > 2 pontos.
Dímero D
É um produto de degradação da fibrina, que pode elevar-se no sangue com qualquer tipo de coágulo. Por isso, tem alta sensibilidade e baixa especificidade, podendo ser usado, quando negativo, para descartar TVP, mas nunca para concluir TVP, quando positivo.
Ecocolor Doppler
Exame de imagem preferível ao Doppler tradicional (que não deve ser empregado) no diagnóstico de TVP, com sensibilidade de 96% e especificidade de 98%.
Tratamento
Deve ser feito com anticoagulação plena com infusão de heparina. Depois, o paciente deve iniciar varfarina por via oral, com dose maior nos 2 primeiros dias.
Após 5 dias, o RNI do paciente deve ser testado, e novamente a cada 15 dias, devendo estar entre 2 e 3.
Uma alternativa é iniciar com anticoagulantes orais mais modernos (dabigatrana, apixabana, endoxabana) em vez de varfarina, o que dispensa a medição do RNI. Porém, são opções mais caras.
Complicações
- Agudas:
- TEP;
- Flegmasia cerúlea dolens/alba (indicação de tratamento cirúrgico);
- Crônica: síndrome pós-trombótica.
Síndrome pós-trombótica
Ocorre a 50% dos pacientes de TVP, constituindo insuficiência venosa crônica, que manifesta-se das seguintes formas:
Sua incidência pode ser reduzida por 50% com uso de meias de compressão de 20-30 mmHg, sendo contraindicadas apenas a pacientes de doença arterial periférica.
Referência(s)
Aula do professor Guilherme de Castro Santos.