Úlceras de membros inferiores: arteriais, venosas, e neuropáticas

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Uma úlcera é uma perda de revestimento tecidual. Nos MMII, implica perda do tegumento, ou mesmo de tecidos mais profundos. São sinal de distúrbio subjacente, e não uma doença em si.

Epidemiologia

Acomete:

  • 1-2% da população adulta de países desenvolvidos;
  • > 4% da população com idade > 65 anos.

Etiologias

  • Vasculares:
    • Venosas (60-70%);
    • Arteriais (até 25% em conjunto com neuropáticas);
    • Arteriovenosas;
    • Vasculites;
  • Neuropáticas (até 25% em conjunto com arteriais);
  • Neoplásicas;
  • Hematológicas:
    • Crioglobulinemia;
    • Anemia falciforme;
    • Esferocitose;
  • Infecto-parasitárias:
    • Bactérias;
    • Fungos;
    • Protozoários;
    • Parasitas;
  • Metabólicas: porfiria;
  • Indeterminadas (3,5%).

Avaliação clínica

  • Localização:
    • Pé (planta, dorso, artelhos, calcâneo): arterial ou neuropática;
    • Área maleolar e perimaleolar medial ou lateral: estase venosa;
    • Perna;
    • Joelho;
    • Coxa.
  • Fator desencadeante:
    • Trauma local;
    • Calor local;
    • Infecção;
    • Espontânea.
  • Evolução:
    • Tempo de doença (dias, meses, anos);
    • História de cicatrização;
    • História e quantidade de recidivas.
  • Dor:
    • Ausente;
    • Pouca (alívio com analgésicos comuns);
    • Muita (impacto nas AVD).
  • Número:
    • Únicas ou múltiplas;
    • Coalescência;
    • Uni ou multilaterais.
  • Tamanho.
  • Bordas:
    • Circulares;
    • Irregulares;
    • Elevadas;
    • Planas;
    • Necróticas;
    • Vegetantes.
  • Fundo (leito):
    • Secreção:
      • Serosa;
      • Sero-hemorrágica;
      • Sero-purulenta;
      • Purulenta;
    • Tecido:
      • Granulação exuberante;
      • Granulação pálida (cicatrização mais lenta);
      • Sem granulação;
      • Tecidos desvitalizados (fibrina, necrose);
      • Exposição de tecidos profundos;
    • Rasa ou funda.
  • Pele ao redor:
    • Normal;
    • Seca;
    • Descamativa;
    • Presença de rachaduras;
    • Hiperpigmentação ocre (estase venosa);
    • Dermatoesclerose;
    • Hiperemia;
    • Elevação de temperatura.

Úlcera de estase venosa

Fatores de risco

  • Idade avançada;
  • IMC elevado;
  • História prévia ou familiar de:
    • TVP;
    • Varizes;
    • Tromboflebite superficial;
    • Ruptura venosa espontânea;
  • Múltiplas gestações;
  • Ortostatismo prolongado.

História natural

  • Risco de mortalidade é virtualmente nulo, mas há perda de qualidade de vida.
  • Cicatrização:
    • 50% em 4 meses;
    • 80% em 2 anos;
    • 92% em 5 anos.
  • Recidiva anual de 6-15%.
  • Início progressivo, levando semanas ou décadas, espontaneamente ou após trauma local.

Quadro clínico

  • Localização preferencial na perna, especialmente na área perimaleolar;
  • Geralmente únicas (quando de longa duração, comum que múltiplas e coalescentes);
  • Tamanho variável;
  • Bordas irregulares e bem definidas.

Propedêutica

Avaliação etiológica deve ser feita por duplex scan, que identifica:

  • Alterações anatômicas: sistema venoso profundo ou superficial;
  • Alterações funcionais: refluxo ou obstrução.

Tratamento

  • Objetivos:
    • Cicatrização da ferida;
    • Prevenção da recidiva.
  • Abordagem sequencial:
    1. Terapia compressiva:
      • Padrão-ouro;
      • Melhora hemodinâmica, aumenta pressão tissular, e age na microcirculação;
      • Pressão externa de 35-40 mmHg;
      • Paciente deve ser incentivado a deambular;
    2. Tratamento local da úlcera:
      • Limpeza da úlcera com solução fisiológica ou água potável;
      • Desbridamento sempre que houver necrose, excesso de fibrina, ou infecção (permitir formação de tecido de granulação e reepitelização):
        • Autolítico (curativos oclusivos);
        • Químico (pomadas com enzimas);
        • Mecânico (cirúrgico);
    3. Intervenção sobre anormalidade venosa:
      • Abolição das fontes de hipertensão venosa;
      • Estabelecimento de comunicações entre os sistemas superficial e profundo;
      • Decisão por abordagem (convencional ou minimamente invasiva) depende sobretudo de disponibilidade, visto que ambas são eficazes.
  • Não há evidência de benefício para medicamentos sistêmicos com a finalidade de melhora da circulação venosa.

Úlcera arterial (isquêmica)

Fatores de risco

Iguais aos da aterosclerose (causa de 90% das úlceras):

  • Tabagismo;
  • Idade avançada;
  • Sexo masculino;
  • Comorbidades:
    • DM;
    • HAS;
    • DAC;
    • DRC;
    • DPOC;
    • Dislipidemia;
    • Doença cerebrovascular.

Apresentação

História clínica

  • Dor intensa:
    • Interrompe AVD;
    • Fatores de piora:
      • Noite;
      • Elevação dos pés;
    • Fatores de melhora:
      • Analgésicos potentes;
      • Manutenção do pé pendente.
  • Surgem espontaneamente ou após trauma local, e não cicatrizam.

Exame físico

  • Aspecto: necrose de pele ou ulcerações sem tecido de granulação.
  • Localização preferencial: pés ou região perimaleolar (após traumas).
  • Extensão: pequenas ou extensas, rasas ou profundas.
  • Pele circundante:
    • Fina;
    • Pálida;
    • Ressecada;
    • Ausência de pelos;
    • Distrofia ungueal.

Tratamento

  • Revascularização (padrão-ouro):
    • Derivações arteriais:
      • Bypass;
      • Ponte de safena;
    • Angioplastia com stent (minimamente invasivo);
  • Amputação.

Úlcera hipertensiva

Lesão microvascular resultante de oclusão de arteríolas por HAS grave.

Epidemiologia

  • Predomina em mulheres de 50-70 anos;
  • Representa 1-2% das úlceras de MMII.

Apresentação clínica

História clínica

  • Dor intensa (confunde com úlcera arterial);
  • HAS grave (PAD > 120 mmHg);
  • Associação a DM em 30-52% dos casos;

Exame físico

  • Localização: terço distal ântero-lateral da perna;
  • Aspecto: úlceras arredondadas, de 2-4 cm;
  • Fundo: pálido, de base necrótica ou granulosa;
  • Profundidade: variável (normalmente rasas);
  • Bordas: violáceas;
  • Hiperpulsatilidade arterial;
  • Pode haver lesões simétricas;
  • Ausência de sinais de doença vascular;
  • Evolução: placas eritematosas → lesões purpúricas → bolhas hemorrágicas → úlceras hipertensivas dolorosas.

Úlcera neuropática

Fisiopatologia

  1. Secundária ao pé diabético, que evolui com:
  2. Distúrbios sensitivos;
  3. Deformidades;
  4. Calosidades;
  5. Ulcerações;
  6. Infecção secundária.

Epidemiologia

  • Maior causa de amputação no mundo.
  • Pé diabético tem risco de 12-25% de desenvolver úlcera ao longo da vida.
  • Ulcerações precedem amputações em 85% dos diabéticos.

Quadro clínico

  • Localização variada, havendo preferência por:
    • Planta dos pés;
    • Pododáctilos;
    • Locais de apoio dos pés;
    • Calosidades.
  • Úlceras indolores, com perda de reflexos e de sensibilidade dolorosa e vibratória.
  • Apesar de isquêmicos (sem pulsos), pés podem estar quentes pela formação de shunts arteriovenosos).
  • Pele ao redor é seca e pode ter fissuras (precedem infecções).
  • Deformidades ósseas (pé de Charcot).

Tratamento

  • Visa à funcionalidade do pé.
  • Prioridade é o combate de infecções, que são responsáveis por mais amputações que a iquemia em si, por meio de:
    • Desbridamentos e amputações parciais;
    • Antibioticoterapia de largo espectro, com cobertura para anaeróbios (posteriormente ajustada à cultura).
  • Pode ser necessária cirurgia de revascularização.

Referência(s)

Aula do professor Túlio Pinho Navarro.


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