⚠️Atenção: esse resumo possui imagens de cadáveres e/ou lesões, que podem causar desconforto
Armas de fogo são objetos contundentes, mas projéteis de arma de fogo (PAFs ou balas) são perfurocontundentes. A energia cinética define a intensidade da lesão, e esta é definida por massa e velocidade do instrumento. O PAF tem massa insignificante, mas velocidade alta, e, quanto mais alta, maior a gravidade da lesão provocada.
Disparo e tiro
O disparo ocorre quando o gatilho do revólver é puxado, mas o tiro é a saída do PAF. Embora estejam normalmente correlacionados, podem ocorrer separadamente (ex.: disparo sem munição, tiro por defeito da arma).
Ferimentos de entrada e saída
As lesões provocadas por PAF são duplas: há ferimento na entrada e na saída (caso o PAF não fique retido). Em geral, o de entrada é pequeno, enquanto o de saída é grande, sangrante, irregular, estrelado, e maior que o PAF.
No plano ósseo, a diferenciação de ferimentos de entrada e saída dá-se pelo sinal do funil de Bonnet. O ferimento de entrada possui ferimento arredondado e regular na lâmina externa, e irregular e maior na interna, formando um cone, com base voltada para dentro. No de saída, isso inverte-se.
Em vísceras, tanto os ferimentos de entrada e de saída terão halo hemorrágico, não sendo possível sua diferenciação.
Ferimento de entrada
Normalmente regulares, com bordas invertidas e invaginadas, exceto quando são tiros encostados em regiões que recobrem tábuas ósseas.
Possuem, independentemente da distância:
- Halo de enxugo: tonalidade escura nos tecidos, resultante da passagem do projétil recoberto por pólvora;
- Aréola equimótica: sufusão hemorrágica por rotura de pequenos vasos ao redor do ferimento;
- Orla de escoriação ou contusão: arrancamento da epiderme pela rotação do projétil.
Ferimento de saída
Tem forma irregular, bordas evertidas, diâmetro maior que o do orifício de entrada (deformação do PAF), e maior sangramento. São extremamente inespecíficos, sequer podendo indicar indubitavelmente que tratam-se de ferimentos por PAF. No entanto, são diferentes dos de entrada principalmente por não apresentarem efeitos secundários, halo de enxugo, e orla de escoriação.
Trajeto no interior do corpo
O trajeto de um PAF é o caminho que ele realiza no interior do corpo, desde sua entrada até sua saída (se houver), sendo extremamente variável conforme posição da vítima. A trajetória refere-se ao caminho do PAF do tiro até a entrada no corpo, que é de competência do perito criminal (não médico).
Dentro do corpo, o trajeto não é em linha reta. O sangue coagulado e as reações inflamatórias sugerem por onde o PAF passou, e indicam que a pessoa estava viva quando recebeu o tiro. É raríssimo a morte ou a imobilização serem instantânos (o chamado stopping power, que é, portanto, um mito).
Caso o PAF (exceto balim/chumbinho) ou a espoleta (outra parte da munição) seja localizado em cirurgia, e sua retirada não vá ocasionar dano ao paciente, deve ser enviado à perícia balística. Caso não seja possível, o cirurgião deve justificar o não envio.
Orientação do disparo
Destaca-se duas formas específicas de disparo:
- Disparo tangencial: “lesão de raspão”, contusa, sem perfuração por PAF;
- Disparo de arma de projéteis múltiplos: espingardas possuem balins/chumbinho, uma munição que se abre na trajetória, com entrada de pequenos projéteis. A rosa de tiro sugere a distância do tiro pela proximidade entre os balins.
Distância do disparo
Padroniza-se que tiros podem ser:
- Encostados: arma em contato com a pele;
- A curta distância: distância < 80 cm, inclui tiros à “queima-roupa”;
- Tiro à distância: distância ≥ 80 cm.
Disparos têm efeitos primários e secundários (residuograma) do disparo. Os primários resultam da ação do PAF, enquanto os secundários são causados por toda a munição, que inclui resíduos de combustão da pólvora e chamas. Apenas os secundários são capazes de esclarecer a distância do disparo (quanto mais presentes, mais próximo o tiro), e apenas os ferimentos de entrada esclarecem a distância.
Tiro encostado
Normalmente, ocorre em regiões que recobrem planos ósseos (ex.: crânio, escápulas). Possui alguns sinais:
- Câmara de mina de Hoffmann ou golpe de mina: quando ocorre sobre ossos, tem forma irregular, denteada, ou com entalhes, e bordas evertidas, porque os gases da explosão penetram no ferimento e refluem com a resistência do osso, deixando o ferimento de entrada igual ao de saída;
- Sinal de Werkgaertner: desenho da boca do cano produzido por sua ação contundente;
- Sinal de Benassi: halo fuliginoso na lâmina externa do osso.
Os ferimentos de entrada podem se assemelhar muito aos ferimentos de saída. Há abundância de nitritos e enxofre de pólvora no sangue do ferimento de entrada (necessidade de exames biológicos).
Halo de enxugo, aréola equimótica, e orla de escoriação, embora presentes, são pouco evidentes.
Tiro a curta distância
São feridas de forma arredondada ou ovalada e bordas invertidas. O residuograma ainda está presente, com algumas peculiaridades:
- Tiro à queima-roupa: termo não técnico, referente a queimadura da pele e crestação (endurecimento) dos pelos pela temperatura elevada dos gases, indica tiro a um máximo de 10 cm de distância;
- Sinais patognomônicos:
- Zona de tatuagem: impregnação de pólvora incombusta na pele causam manchas permanentes;
- Zona de esfumaçamento: deposição de resíduos de pólvora combusta, que saem à lavagem. Indica o limite da curta distância, ou seja, a arma estava próxima de chegar à distância de 80 cm.
Tiro à distância
Apenas o projétil atinge a vítima, sem residuograma, gerando ferida arredondada ou ovalada, de bordas invertidas, e diâmetro menor que o do projétil por retração da pele. Apenas as orlas de enxugo e escoriação e a aréola equimótica estão presentes, de modo que, sem informações sobre a arma e o disparo, não é possível saber a distância exata.
Referência(s)
Aulas da professora Luciana de Paula Lima Gazzola.