É uma das infecções mais prevalentes na pediatria, definida pela multiplicação de uma bactéria patogênica em qualquer segmento do TGU, identificada por urocultura.
Epidemiologia
- No neonato e lactente de até 6 meses de idade, prevalece em meninos. Depois disso, acomete principalmente meninas (20:1);
- Picos de incidência:
- Entre 3-5 anos de idade;
- Adolescência (início da atividade sexual);
- 8% das crianças terá ao menos uma ITU entre 1 mês e 11 anos de idade;
- ITUs recorrem em 40% dos pacientes, mas raramente em meninos.
Etiologia
- Pode ocorrer por via hematogênica (RNs) ou ascendente. A urina é, normalmente, estéril, mas o TGU pode se contaminar por bactérias presentes no períneo e, no caso de meninos menores de 5 anos, no prepúcio.
- Bactérias causadoras de ITU pediátrica:
- Escherichia coli (80% dos casos);
- Proteus spp;
- Staphylococcus saprophyticus;
- Staphylococcus aureus;
- Staphylococcus epidermidis;
- Enterococcus spp;
- Enterobacter spp;
- Pseudomonas spp;
- Haemophilus influenzae.
- ITUs causadas por bactérias não E. coli têm maior chance de ocasionar cicatriz renal.
- A urocultura pode vir contaminada por bactérias benignas (não causadoras de clínica de ITU), como lactobacilos e estafilococos coagulase-negativos.
Sinais e sintomas
RN
- Febre baixa (40-50% dos casos);
- Palidez;
- Cianose;
- Irritabilidade/Apatia;
- Comprometimento do estado geral;
- Perda de peso;
- Icterícia.
Lactente
- Febre;
- Sintomas de difícil detecção:
- Disúria;
- Urgência urinária;
- Polaciúria;
- Anorexia;
- Êmese;
- Ganho de peso inadequado;
- Irritabilidade.
Pré-escolar e escolar
- Cistite:
- Disúria;
- Urgência urinária;
- Polaciúria.
- Pielonefrite:
- Febre;
- Dor lombar.
- Importante realizar diagnóstico diferencial com ISTs.
Anamnese e exame físico
- Jato urinário e hábitos miccionais (paciente alterou seus hábitos? Perdeu controle miccional já previamente adquirido?);
- Hábito intestinal e prurido anal;
- Episódios anteriores de ITU;
- Crescimento inadequado;
- Pesquisa do sinal de Giordano;
- Exame da genitália externa e do períneo (presença de leucorreia);
- Pressão arterial;
- Exame da região lombossacra (sinais de disrafismo oculto em pacientes de ITU de repetição).
Propedêutica
Urocultura
- Padrão ouro para diagnóstico de ITU.
- Considerada positiva se ≥ 100 000 UFC/mL (jato médio por coleta limpa).
- Idealmente, coleta-se no lactente por punção suprapúbica, mas é mais comum que seja coletada por saco coletor. O saco deve ser substituído a cada 30 min para evitar contaminação.
- Urinálise sem alterações não exclui ITU. Entretanto, sinais sugestivos são:
- Piúria (> 5 piócitos/campo);
- Cilindros leucocitários;
- Nitrito positivo.
- Urocultura só deve ser solicitada em presença de sinais e sintomas de ITU (não tratar bacteriúria assintomática).
Exames de imagem
- USG de vias urinárias:
- Crianças com menos de 2 anos e 1ª ITU febril;
- Crianças de qualquer idade com ITUs febris recorrentes;
- Crianças de qualquer idade com ITU que tenham baixo crescimento, hipertensão, e/ou histórico familiar de doença renal ou urológica;
- Crianças que não respondem à antibioticoterapia;
- Uretocistografia de vias urinárias:
- Crianças de qualquer idade com ≥ 2 ITUs febris; ou
- Crianças de qualquer idade com 1ª ITU febril e qualquer um desses:
- Anomalias na USG renal;
- Combinação de T ≥ 39ºC e um patógeno que não seja E. coli;
- Baixo crescimento;
- Hipertensão.
Diagnóstico diferencial
- Febre sem foco: pneumonia oculta, bacteremia oculta;
- Febre, dor abdominal, e piúria: apendicite, doença de Kawasaki;
- Sintomas urinários sem bacteriúria: disfunção intestinal, disfunção vesical, hipercalciúria;
- Sintomas urinários com bacteriúria: vulvovaginites, uretrites, corpo estranho vaginal, cálculo urinário;
- Irritantes locais;
- Abuso sexual.
Tratamento
Os cuidadores da criança devem ser orientados a retornar ao serviço de saúde caso ela apresente piora do estado geral.
Sintomáticos
- Hidratação (preferencialmente via oral);
- Antitérmicos;
- Analgésicos.
Antibioticoterapia
- Tempo de tratamento:
- ITU febril ou recorrente: 10 dias;
- Maior de 2 anos no 1º episódio de ITU afebril: 7 dias.
- Quanto mais precoce a antibioticoterapia, menor a chance de sequelas (cicatrizes renais).
- Não é necessário realizar urocultura de controle caso a criança permaneça assintomática.
Tratamento via oral
Apresentação (mg/5 mL) | Dose/Dia (mg/kg/dia) | Número de doses diárias | |
---|---|---|---|
Cefalexina | 250 | 50-100 | 4 |
Sulfametoxazol + Trimetoprim | 400 + 80 | 40 + 8 | 2 |
Amoxicilina + Clavulanato | 250 + 62,5 | 50 | 3 |
Tratamento via parenteral
Apresentação (mg) | Dose/Dia (mg/kg/dia) | Número de doses diárias | |
---|---|---|---|
Ceftriaxona | 500 (intravenosa) | 50-100 | 1-2 |
Gentamicina | 20, 40, 80, 120, 160, 280 (intravenosa ou intramuscular) | 6-7,5 | 1 |
Quimioprofilaxia
- Indicada a crianças:
- Sem refluxo vesicoureteral:
- Com ITUs recorrentes frequentes;
- Com hidronefrose congênita;
- Com refluxo vesicoureteral graus IV ou V ou anomalia urológica importante.
- Sem refluxo vesicoureteral:
Apresentação (mg/5 mL) | Dose/Dia (mg/kg/dia) | Número de doses diárias | |
---|---|---|---|
Cefalexina | 200 + 40 | 6-7,5 | 1 |
Sulfametoxazol + Trimetoprim | 25 (manipulado) | 1-2 | 1 |
Amoxicilina + Clavulanato | 250 | 50 | 1 |
- Reservar cefalosporinas de 1ª geração (ex.: cefalexina) a lactentes menores de 3 meses de idade.
- Não utilizar nitrofurantoína ou sulfas em menores de 2 anos.
Referência(s)
Aula da professora Flávia Cristina de Carvalho Mrad.