A rinite alérgica é uma inflamação da mucosa nasal, caracterizada por ao menos um dos sintomas: congestão nasal, hiperemia conjuntivas, coriza, espirros, e prurido. Por acometer até 25-30% da população infantojuvenil, é importante tema no cuidado pediátrico.
Fisiopatologia
- As narinas exercem as funções de limpar, umidificar, e aquecer o ar inspirado, além de possuir um complexo mecanismo de defesa. Na rinite alérgica, tais funções são prejudicadas por alterações na integridade do epitélio nasal e no transporte e na depuração mucociliar.
- Em indivíduos geneticamente predispostos, a inalação de substâncias alergênicas, exposição a mudanças bruscas de clima, inalação de ar frio e seco, ou inalação de irritantes inespecíficos provoca formação de anticorpos IgE específicos, que se ligam a receptores mastocitários.
- 4-8 h após a exposição ao alérgeno, a infiltração eosinofílica da mucosa nasal, mediada por interleucinas, moléculas de adesão, leucócitos, leucotrienos, e produtos de eosinófilo produzem dano tissular por ruptura da integridade da membrana basal na mucosa nasal.
- Progressivamente, ocorre remodelamento do epitélio nasal.
Fatores desencadeantes da rinite alérgica
- Alérgenos:
- Ácaros da poeira;
- Fungos;
- Baratas;
- Animais:
- Gato;
- Cão;
- Cavalo;
- Hamster;
- Pólens;
- Ocupacionais:
- Trigo;
- Poeira de madeira;
- Detergentes;
- Látex.
- Irritantes e poluentes:
- Intradomiciliares:
- Fumaça de cigarro;
- Odores fortes;
- Gás de cozinha;
- Extradomiciliares:
- Ozônio;
- Óxidos do nitrogênio;
- Dióxido de enxofre.
- Intradomiciliares:
Quadro clínico
- Prurido, que pode ser nasal, ocular, palatal, ou do conduto auditivo;
- Coriza hialina;
- Espirros;
- Alterações de paladar, olfato, e/ou audição;
- Obstrução nasal, voz anasalada;
- Respiração oral, roncos noturnos, bruxismo;
- Odinofagia;
- Pigarro;
- Olheiras, linha de Dennie-Morgan, e/ou prega no dorso do nariz;
- Cornetos nasais edemaciamos e pálidos;
- Palato em ogiva, má oclusão dentária.
Diagnóstico
Fluxogramas
Classificação
A classificação do consenso Allergic Rhinitis and Its Impact on Asthma (ARIA) preconiza o seguinte:
Diagnósticos diferenciais
- Caso o quadro seja agudo:
- IVAS;
- Corpo estranho;
- Trauma.
- Caso o quadro seja crônico:
- Alergia respiratória;
- Infecções de repetição;
- Alterações anatômicas congênitas.
- Caso o teste alérgico seja negativo:
- IVAS;
- Imunodeficiência;
- Hipotireoidismo;
- Fibrose cística;
- Rinite medicamentosa (agonistas adrenérgicos, vasoconstrictors tópicos);
- Rinite eosinofílica não alérgica (RENA).
Comorbidades
- Conjuntivite: sintomas oculares como prurido, queimação, fotossensibilidade, lacrimejamento, vermelhidão, e edema podem surgir, e a coçadura pode provocar lesões da córnea, como ulcerações, microerosões, e ceratocone;
- Síndrome do respirador oral: provocada pela obstrução nasal, podendo causar alterações craniofaciais;
- Sinusite: o termo rinussinusite alérgica é utilizado para se referir a inflamações acometendo a mucosa nasal e os seios da face, ocorrida pela continuidade entre ambos, o que torna o quadro de sinusite frequente em pacientes de rinite e vice-versa;
- Otite: a inflamação alérgica pode acometer a tuba auditiva;
- Asma: metade dos asmáticos têm rinite alérgica, e 10-40% dos pacientes de rinite alérgica têm asma.
Tratamento
Objetivos
- Reduzir o risco da doença e de suas comorbidades;
- Prevenir crises de asma e consequente hospitalização;
- Melhorar a qualidade de vida;
- Minimizar efeitos adversos.
Medidas não farmacológicas
- Realizar lavagens nasais com solução salina a 0,9%;
- Evitar inalação passiva de tabaco, bem como inalação de fumaças, poluição, gases, aerossóis, e perfumes;
- Posicionar a cama do paciente alérgico em local arejado e quente, evitando deixá-la encostada na parede;
- Abrir as janelas da casa pelo menos 1 h por dia;
- Evitar carpetes, tapetes, cortinas, e móveis desnecessários que possam acumular poeira;
- Lavar cortinas com frequência, dando preferência a cortinas leves;
- Conservar roupas, livros, e outros objetos dentro de armários fechados;
- Evitar levantar muito pó durante a limpeza da casa, dando preferência ao uso de pano úmido;
- Encapar travesseiros e colchões com capa impermeável;
- Evitar roupas e cobertores de lã;
- Lavar cobertores e colchas a cada 2 semanas e expô-los ao sol;
- Não andar em locais empoeirados, como porões e depósitos;
- Evitar odores fortes;
- Eliminar brinquedos de tecido, especialmente pelúcia;
- Evitar animais de pelo ou penas em casa, e, caso haja, mantê-los limpos e intensificar a limpeza da casa;
- Evitar contato com pó, talco, e giz;
- Não deixar plantas dentro de casa.
Medidas farmacológicas
Anti-histamínicos
- São efetivos no controle do prurido, dos espirros, e da coriza, mas não são eficazes na descongestão nasal.
- Anti-histamínicos de 1ª geração atravessam a barreira hematoencefálica, causando sedação. Por isso, deve-se preferir os de 2ª, que também possuem efeito mais prolongado e menor afinidade anticolinérgica.
- A partir dos 6 anos de idade, pode-se usar anti-histamínicos tópicos.
Corticoides intranasais
- Aliviam todos os sintomas da rinite alérgica.
- Têm início de ação em 30 min e eficácia máxima após 2-4 semanas de uso.
- Todas as formulações comercialmente disponíveis são igualmente eficazes, variando sua absorção sistêmica. Embora todos sejam absorvidos, alguns são mais que outros, sendo:
- Alta absorção:
- Beclometasona;
- Budesonida;
- Baixa absorção:
- Ciclesonida;
- Fluticasona;
- Mometasona.
- Alta absorção:
- Uso deve ser na menor dose possível, com o objetivo de descontinuá-la se viável.
Descongestionantes nasais
- Mais frequentemente é empregada a pseudoefedrina, que pode ser de uso oral ou tópico.
- Uso oral pode causar nervosismo, insônia, irritabilidade, e palpitação.
- Uso tópico deve ser evitado pelo efeito rebote e risco de rinite medicamentosa, podendo ser usados por um máximo de 5 dias.
Uso correto de spray nasal
- Antes do uso, lavar as narinas com soro fisiológico e assoá-las;
- Agitar o frasco e remover a tampa;
- Segurar o frasco na vertical;
- No primeiro uso, disparar a válvula até que ocorra a liberação uniforme de medicamento;
- Inclinar a cabeça levemente para baixo;
- Introduzir a ponta do aplicador em cada narina, direcionando-o para a parede lateral, e pressionar para disparar o jato;
- Limpar o aplicador e guardá-lo tampado.
Medicações disponíveis no SUS-BH
Medicação | Apresentações | Dosagem |
---|---|---|
Loratadina | • Comprimido 10 mg • Solução oral 1 mg/mL | • Crianças > 2 anos e < 30 kg: 5 mg/dia • Crianças > 12 anos e > 30 kg: 10 mg/dia |
Desloratadina | Xarope 0,5 mg/mL | 6-12 meses: 1 mg/dia |
Maleato de dexclorfeniramina | Solução oral 0,4 mg/mL | Gestantes: 2-6 mg/dia, de 8/8 hrs, com dose máxima de 12 mg/dia |
Budesonida | Suspensão nasal aquosa 50 μg/dose | A partir de 6 anos: 1-2 jatos em cada narina de 12/12 h, com dose de 64-400 μg/dia |
Mometasona | Suspensão nasal aquosa 50 μg/dose | 2-5 anos: 1 jato em cada narina 1x/dia |
Furoato de fluticasona | Suspensão nasal 27,5 mcg/dose | 2-5 anos: 1-2 jatos em cada narina 1x/dia |
Imunoterapia
- Indicadas a pacientes que:
- Não desejarem fazer uso de medicação contínua;
- Não controlarem seus sintomas com farmacoterapia convencional;
- Não possam afastar o alérgeno;
- Estejam em risco de efeitos colaterais graves com a medicação.
- Deve ser realizada por alergologistas, em locais aptos a tratar eventuais reações sistêmicas.
Atribuições do médico generalista
- Reconhecimento e captação de pessoas que apresentem:
- Utilização frequente de serviços de urgência para tratamento de chieira e/ou sinusites;
- Utilização excessiva de medicamentos em gotas nasais;
- Internação prévia por pneumonia ou asma;
- Sinusites de repetição;
- Indicação ou realização de tonsilectomia;
- Roncos e dificuldade para respirar, principalmente à noite;
- Sonolência excessiva diurna;
- Atraso na aquisição de leitura fluente, troca de sílabas, déficit na concentração e no raciocínio matemático;
- Déficit auditivo ou colocação de tubos de ventilação nos ouvidos;
- Crises recidivantes de manchas pruriginosas pelo corpo;
- Orientação de familiares sobre controle ambiental de rinite alérgica e asma;
- Orientar e oferecer tratamento para cessação de tabagismo nos fumantes identificados na família;
- Acompanhar pacientes com rinite de acordo com a classificação:
- Rinite intermitente leve: 6 em 6 meses;
- Rinite intermitente moderada-grave: 3 em 3 meses ou sob demanda;
- Rinite persistente leve: 2 em 2 meses;
- Rinite persistente moderada-grave: todo mês;
- Orientar técnica de uso da medicação e adesão adequada a ela;
- Reavaliar em toda consulta o controle dos agentes desencadeantes;
- Encaminhar ao pediatra casos duvidosos e/ou de resposta insatisfatória ao tratamento.
Critérios de encaminhamento
Referência(s)
FONSECA, Ana Cristina de Carvalho Fernández; SAD, Corina Toscano; PARIZZI, Márcia Rocha; et al. Guia de Manejo das Pessoas com Rinite Alérgica. Belo Horizonte: Secretaria Mundial de Saúde, 2015.