Introdução
- São transtornos que afetam a cognição do indivíduo. Cognição inclui:
- Memória;
- Linguagem;
- Orientação;
- Julgamento/Pensamento;
- Condução de relações interpessoais;
- Praxia;
- Resolução de problemas.
- São especialmente frequentes em idosos.
- Além dos sintomas cognitivos que caracterizam esses transtornos, a sintomatologia comportamental simultânea (oriunda da própria demência ou de uma etiologia paralela) pode complicar o quadro e trazer sofrimento ao paciente e ao seu cuidador. Síndromes que podem ocorrer incluem:
- Ansiedade;
- Depressão;
- Problemas de sono;
- Psicose;
- Agressividade.
Avaliação clínica
- Deve ser investigado o desenvolvimento da doença. O médico deve obter um relato detalhado das mudanças das atividades de vida diária (autocuidado, responsabilidades no trabalho, interações com amigos, atividades recreativas, religiosas, e sociais, cuidado com as próprias finanças, etc) do paciente, pois a compreensão da vida do paciente no passado é que permite definir a linha de base para aspectos como atenção, concentração, intelecto, personalidade, psicomotricidade, afetividade, e percepção.
- Um exame psíquico completo é necessário para compreender o acometimento de cada paciente, bem como para basear comparações futuras que possam documentar a efetividade (ou sua ausência) de terapias.
- Ao avaliar funções cognitivas, o médico deve avaliar memória, habilidades visuoespaciais, escrita, leitura, e habilidades matemáticas, levando sempre em conta o contexto sociocultural de cada paciente.
Avaliação patológica e laboratorial
- Exames adicionais são especialmente necessários para pacientes que possuam doenças etiologicamente relacionadas ou comórbidas. A maioria das doenças cerebrais que levam a distúrbios psicopatológicos também se manifestam com uma variedade de anormalidades periféricas ou centrais, que podem ser acusadas pelos exames.
- Inicialmente, exames de rastreio que podem ser realizados incluem:
- Hemograma e leucograma;
- Eletrólitos séricos;
- Glicose sérica;
- Ureia e creatinina séricas;
- Testes de função hepática;
- Testes de função tireoidiana;
- Proteínas séricas;
- Exames toxicológicos;
- Urinálise;
- Testes de gravidez (para mulheres em idade fértil);
- Eletrocardiografia (ECG).
Eletroencefalografia (EEG)
- Exame acessível e não invasivo de disfunção cerebral, com alta sensibilidade e especificidade relativamente baixa.
- Útil para detecção de epilepsias, delirium leve, lesões, e estados metabólicos e tóxicos.
Tomografia computadorizada (TC) e ressonância magnética (RM)
- Na neuropsiquiatria, a RM é mais útil e custo-efetiva que a TC, exceto em casos de hemorragias cerebrais agudas ou hematomas (que raramente se apresentam em consultórios psiquiátricos).
- A RM permite distinção entre massa branca e massa cinzenta, sendo útil na identificação de lesões em regiões periventriculares e subcorticais. Embora possa detectar anomalias de massa branca que ocorrem em patologias (como esclerose múltipla, HIV, hipertensão, demência vascular, ou doença de Alzheimer), essas anomalias são comuns também no envelhecimento normal, o que faz com que a RM seja mais útil para excluir diagnósticos (como tumores e doença vascular) que para especificá-los.
Biópsia cerebral
Pode diagnosticar doença de Alzheimer, encefalopatia autoimune, e tumores, mas possui riscos, e só deve ser realizada quando nenhuma outra técnica tiver sido suficiente para estabelecer o diagnóstico.
Testagem neuropsicológica
Testes produzem avaliações padronizadas e quantitativas das habilidades cognitivas de um paciente, e são úteis em avaliações iniciais e em reavaliações periódicas. A escolha de um teste específico deve, porém, levar em conta as forças e fragilidades de cada método.
Delirium
- Declínio agudo da cognição e do nível de consciência, com impacto agudo sobre a atenção.
- Subcategorias (baseadas em sua causa):
- Condição médica generalizada;
- Induzido por substâncias;
- De causas múltiplas;
- Por outras ou múltiplas etiologias.
- Traz risco de vida, mas é potencialmente reversível.
Diagnóstico e características clínicas
- Sintomas principais:
- Consciência alterada;
- Atenção alterada.
- Outros sintomas psíquicos presentes;
- Desorientação (especialmente quanto a tempo e espaço);
- Memória comprometida;
- Anormalidades de humor, percepção, e comportamento.
- Sintomas sistêmicos:
- Tremor;
- Asterixe;
- Nistagmo;
- Incoordenação;
- Incontinência urinária.
- Outras características relevantes para o diagnóstico:
- Início abrupto;
- Evidência de causa orgânica.
Exames físicos e laboratoriais
- EEG tipicamente mostra alentecimento difuso da atividade de fundo, embora pacientes com delirium causado por retirada de substâncias depressoras tenham atividade rápida de baixa voltagem.
- Exames mentais rápidos, como o Mini Exame do Estado Mental (MEEM), permitem documentar o comprometimento cognitivo e identificar a linha de base do paciente.
- O exame físico pode revelar a causa do delirium.
- Doenças físicas e história de TCE ou abuso de substâncias aumentam a chance de diagnóstico de delirium.
Diagnóstico diferencial
Demência
- Principais pontos de diferenciação:
- Flutuação no nível atencional é exclusiva do delirium;
- Estabelecimento dos sintomas é súbito no delirium, enquanto nas demências (exceto na demência vascular causada por AVE) é insidioso.
- Pacientes com demência normalmente estão alertas, enquanto os de delirium têm alterações da consciência.
- Pode ocorrer delirium em pacientes de demência.
Esquizofrenia
- Pacientes de esquizofrenia podem ter episódios de comportamento extremamente desorganizado, mas as alucinações e delírios desses pacientes são mais organizados que nos de delirium.
- Alterações nos níveis de consciência ou na orientação são mais típicos do delirium.
Depressão
Sintomas hipoativos de delirium se parecem com depressão severa, mas pode-se diferenciar os dois diagnósticos pela confusão mental presente no delirium e pelas alterações no EEG.
Curso e prognóstico
- Curso típico:
- Estabelecimento rápido (horas ou dias);
- Duração breve (dias a semanas);
- Flutuações marcadas e imprevisíveis da severidade;
- Ocasional piora à noite (síndrome crepuscular);
- Gravidade oscila entre períodos de lucidez e severo comprometimento cognitivo e desorganização.
- Sintomas prodrômicos (ex.: agitação e medo) podem surgir nos dias que precedem o surgimento de sintomas típicos.
- Episódios de delirium duram menos que 1 semana, mas os sintomas persistem até que se remova o agente etiológico. Após sua remoção, os sintomas podem levar entre 3-7 dias e 2 semanas para desaparecer.
- As lembranças do que ocorreu durante o delirium tendem a ser vagas.
- Após um quadro de delirium, pode surgir depressão ou estresse pós-traumático.
Tratamento
O principal objetivo do tratamento deve ser a remoção da causa subjacente e o suporte físico (manter o paciente em segurança), sensorial, e ambiental (não hiperestimular o paciente).
Farmacoterapia
- Em casos em que a etiologia seja toxicidade anticolinérgica, pode-se empregar salicilato de fisostigmina.
- Sintomas de delirium (psicose, agitação, e insônia) podem exigir farmacoterapia.
- Haloperidol e droperidol podem ser utilizados para sintomas psicóticos, mas podem causar prolongação do intervalo QT.
- Fenotiazinas devem ser evitadas, pois têm atividade anticolinérgica.
- Para agitação, a estratégia tende a ser a sedação, que pode ser feita com antipsicóticos, valproato de sódio, e, em último caso, dexmedetomidina.
- A insônia pode ser tratada com benzodiazepínicos, que podem, todavia, piorar a confusão do paciente. Se dor estiver presente, pode-se empregar opioides.
Tratamento em populações especiais
Doença de Parkinson
Medicamentos antiparkinsonianos, especialmente em pacientes com demência, podem causar delirium. Caso não se possa reduzir a dosagem desses medicamentos, ou caso o delirium persista após essa medida, pode-se empregar antipsicóticos (preferencialmente pimavanserina e, secundariamente, clozapina ou quetiapina).
Pacientes terminais
O foco pode, a depender dos desejos do paciente, se tornar o conforto em vez da busca agressiva pela etiologia do delirium.
Etiologia1
- Causado por um ou mais distúrbios sistêmicos que afetem à função cerebral. Exemplos importantes:
- Doença do SNC;
- Doença sistêmica grave;
- Disrúrbios metabólicos;
- Retirada ou intoxicação por fármacos (quaisquer fármacos) ou toxinas.
- Uma das causas mais frequentes é a toxicidade por medicações com atividade anticolinérgica.
Demência (transtorno neurocognitivo maior)
- Marcada por profundo comprometimento da memória, do julgamento, da orientação, e da cognição.
- Subcategorias:
- Doença de Alzheimer;
- Vascular;
- Por HIV;
- Por traumatismo cranioencefálico (TCE);
- Frontotemporal (doença de Pick);
- Com corpos de Lewy;
- Por príon;
- Induzida por substâncias;
- De múltiplas etiologias;
- Não especificada.
- Distingue-se do retardo mental por ser uma condição degenerativa, ou seja, de deterioração após um desenvolvimento normal.
- A doença pode ser estática ou progressiva, permanente ou reversível.
Diagnóstico e características clínicas
- É crítico identificar a síndrome demencial e sua etiologia, pois cerca de 15% das demências são reversíveis caso o tratamento seja suficientemente precoce.
- Sintomas → Declínio significativo ou moderado nas seguintes funções cognitivas:
- Atenção;
- Função executiva;
- Memória/Aprendizagem;
- Linguagem;
- Psicomotricidade;
- Orientação;
- Cognição social.
- O paciente deve apresentar um ou mais sintomas, que devem impactar sua habilidade de performar independentemente suas atividades de vida diária.
- O diagnóstico baseia-se na anamnese, no exame psíquico, e em informações fornecidas por familiares, amigos, e empregadores.
- Perda de memória é frequente em demências, especialmente nas corticais, como a Doença de Alzheimer, e, inicialmente, afeta eventos recentes.
- Não há alteração de consciência.
Mudanças psiquiátricas e neurológicas
- Personalidade: traços preexistentes podem se acentuar, ou o paciente pode tornar-se mais introvertido ou paranoico. Demências de acometimento frontal e temporal têm mudanças marcadas de personalidade, e podem ser irritáveis, explosivos, e com baixo controle de impulsos.
- Alucinações e delírios: 20-30% dos pacientes têm alucinações, e 30-40% têm delírios (especialmente paranoides), normalmente pouco organizados e/ou sistematizados.
- Humor: depressão e ansiedade estão presentes em 40-50% dos pacientes, e síndromes depressivas completas em 10-20%. Eles também podem apresentar riso ou choro patológicos, sem gatilhos claros.
- Mudança cognitiva: são comuns afasias, apraxias, e agnosias. Manifestações neurológicas como convulsões e reflexos primitivos também podem ocorrer.
- Abstração e reação catastrófica: pacientes de demência têm dificuldades de pensamento abstrato, e podem se agitar quando percebem seus défices intelectuais em situações estressantes. Durante a anamnese, podem evitar demonstrar falhas na performance intelectual desviando o foco da entrevista.
- Síndrome crepuscular: é a manifestação, normalmente durante a noite, de confusão, ataxia, e sonolência. Pode estar relacionada a medicamentos psicoativos ou à redução de estímulos externos.
Demência vascular
Tem uma sintomatologia semelhante à da doença de Alzheimer, mas a deterioração ocorre em degraus abruptos. Também é necessário que haja evidência (clínica, laboratorial, ou radiológica) de etiologia vascular para realizar esse diagnóstico.
Demência persistente induzida por substâncias
É causada principalmente por álcool, inalantes, sedativos, hipnóticos, e ansiolíticos. No caso do álcool, é necessário realizar o diagnóstico diferencial entre as síndromes de Korsakoff e Wernicke-Korsakoff, sendo marcado, no caso da demência, um declínio cognitivo que extrapola a amnésia.
Patologia, achados físicos, e exames laboratoriais
- Testes laboratoriais de rotina devem ser feitos para descartar causas reversíveis de demência. Como, porém, as etiologias possíveis são várias, a seleção de exames adicionais deve ser orientada pelas suspeitas clínicas.
- RM e tomografia SPECT podem ajudar na detecção de certos padrões metabólicos cerebrais, o que é importante especialmente na distinção entre doença de Alzheimer e demência vascular.
- Um exame físico completo é importante para identificar possíveis anormalidades sistêmicas, assim como sintomas neurológicos focais (sugestivos de etiologia vascular).
Diagnóstico diferencial
Ataques isquêmicos transitórios
Tratam-se de episódios breves de disfunção neurológica focal que duram menos de 24 h. Apesar de serem fator de risco para futuros infartos cerebrais, distinguem-se da demência vascular por sua duração curta.
Delirium
Em geral, o delirium tem estabelecimento rápido, duração breve, flutuação do nível de comprometimento cognitivo ao longo do dia, exacerbação noturna dos sintomas, marcados transtornos do ciclo sono-vigília, e distúrbios proeminentes da atenção e da percepção.
Depressão
Pacientes depressivos podem apresentar acometimento cognitivo semelhante ao da demência, mas costumam ter maior consciência de morbidade, sintomas depressivos proeminentes, e histórico de episódios depressivos. Também respondem a medicação antidepressiva.2
Transtornos factícios
A simulação de perda de memória costuma ser inconsistente, fugindo ao padrão demencial de perda da memória recente antes da memória remota.
Esquizofrenia
Embora a esquizofrenia curse com deterioração intelectiva, esse é um sintoma menos notável que a psicose e a desordem de pensamento.
Envelhecimento normal
Nem sempre o envelhecimento normal cursa com declínio cognitivo, mas pequenos problemas de memória podem ocorrer no envelhecimento normal. Eles distinguem-se da demência por não interferirem significativamente no comportamento social ou ocupacional da pessoa.
Outros transtornos
- Na amnésia, não há deterioração cognitiva além da memória.
- Distúrbios hipofisários, embora raros, devem ser descartados.
Curso e prognóstico
- Classicamente, a demência estabelece-se em pacientes acima de 60 anos e progride por cerca de 5-10 anos, mas isso é altamente variável. Pacientes de Alzheimer têm expectativa de sobrevida média de 8 anos, variando de 1 a 20 anos.
- Pacientes com estabelecimento prematuro ou histórico familiar de demência tendem a ter deterioração mais rápida.
- Demência costuma iniciar-se com sinais sutis que estabelecem-se gradual (doença de Alzheimer, demência vascular, endocrinopatias, tumores cerebrais, transtornos metabólicos) ou abruptamente (TCE, parada cardíaca com hipóxia cerebral, encefalite).
- Nos estágios terminais da demência, pacientes ficam profundamente desorientados, incoerentes, amnésicos, e desenvolvem incontinência fecal e urinária.
- A depender do tipo de demência, o curso clínico pode progredir para melhora, piora, ou estabilidade.
- A inteligência e o nível intelectual pré-morbidos do paciente, bem como a velocidade de estabelecimento dos sintomas, influenciam sua capacidade de compensar défices intelectivos.
Tratamento
- O diagnóstico correto é de vital importância, pois pode permitir alentecimento ou reversão do curso da doença.
- No caso da demência vascular, medidas preventivas são particularmente importantes, e incluem controle de diabetes e hipertensão, assim como anticoagulação em alguns pacientes. A pressão arterial sistêmica deve ser mantida no extremo mais alto do normal.
Terapias psicossociais
- A consciência de morbidade pode ser perturbadora para o paciente. Nesse sentido, psicoterapia de suporte e educação pode beneficiar a qualidade de vida e autoestima do paciente. Ele também pode ser auxiliado para encontrar maneiras de compensar os défices estabelecidos.
- Os familiares ou cuidadores de pacientes de demência frequentemente precisam de suporte psicoterápico.
- Exercício físico pode ser benéfico, especialmente nos estágios iniciais.
Farmacoterapia
- Sintomas como ansiedade, depressão, e alucinações e delírios podem ser tratadas com psicotrópicos apropriados, mas deve-se considerar a possibilidade de efeitos adversos mais graves na população idosa. Também deve-se evitar a prescrição de drogas com alta atividade anticolinérgica.
- Donepezila, rivastigmina, galantamina, e tacrina são inibidores da colinesterase empregados para tratar acometimento cognitivo leve a moderado em pacientes com doença de Alzheimer. Eles são mais úteis em pacientes que têm neurônios colinérgicos preservados. Nenhuma dessas drogas previne o progresso da doença.
- Memantina protege neurônios de quantidades excessivas e neurotóxicas de glutamato, podendo melhorar alguns casos de demência.
Etiologia
As demências mais comuns são a doença de Alzheimer e a demência vascular. Outras etiologias que contribuem para cerca de 10% dos casos de demência são demência com corpos de Lewy, demência frontotemporal, hidrocefalia de pressão normal, demência alcoólica, demência infecciosa (ex.: HIV, sífilis), e doença de Parkinson. Causas potencialmente reversíveis encontradas na clínica incluem anormalidades metabólicas (ex.: hipotireoidismo), deficiências nutricionais (ex.: vitamina B12, folato), e depressão.
Doença de Alzheimer
- O diagnóstico definitivo da doença de Alzheimer depende da neuropatologia cerebral. Normalmente, é feito pelo quadro clínico.
- Fatores genéticos são contribuidores importantes para a etiologia, com alguns casos raros sendo explicados por genes específicos.
- Um marcador importante da doença é a formação de placas senis de proteínas beta-amiloides no cérebro.
- O cérebro do paciente apresenta atrofia difusa com sulcos corticais achatados e ventrículos cerebrais aumentados. A perda neuronal ocorre particularmente no córtex e no hipocampo (distribuição parietal-temporal).
- Os neurotransmissores acetilcolina e norepinefrina estão provavelmente hipoativos em pacientes de Alzheimer.
Demência vascular
Resulta de várias áreas de doença vascular cerebral, em que vasos de pequeno e médio calibre sofrem infartos que produzem múltiplas lesões do parênquima cerebral.
Demência frontotemporal
- Regiões frontotemporais do cérebro sofrem atrofia, com perda neuronal, gliose, e presença de corpos de Pick (massas de elementos do citoesqueleto).
- Aproximadamente metade dos casos são familiares.
- Estabelecimento típico ocorre antes dos 75 anos de idade.
Doença de corpos de Lewy
- Possui clínica similar à da doença de Alzheimer, mas apresenta alucinações e sintomas extrapiramidais.
- Corpos de inclusão de Lewy estão presentes no córtex cerebral.
Doença de Huntington
- Doença dos gânglios basais, que pode associar-se com demência subcortical, com acometimento motor maior que o acometimento da linguagem.
- Há alta incidência concomitante de depressão e psicose.
Doença de Parkinson
- Doença dos gânglios basais, comumente associada a demência e depressão.
- Alguns pacientes apresentam alentecimento do curso do pensamento.
Demência relacionada ao HIV
- Cerca de 14% dos pacientes de HIV desenvolvem demência anualmente, e 75% dos pacientes de AIDS têm envolvimento do SNC detectado à autópsia.
- Anormalidades do parênquima cerebral são visíveis à RM.
- Diagnóstico exige confirmação da infecção por HIV e exclusão de outras possíveis etiologias para o acometimento cognitivo.
Demência relacionada a TCE
Especialmente quando ocorrem recorrentemente, TCEs podem causar demência com labilidade emocional, disartria, e impulsividade. Algumas vezes, ela pode ser reversível (ex.: hematomas subdurais removíveis cirurgicamente).
Transtornos amnésicos
- Transtornos neurocognitivos maiores marcados primariamente por perda de memória e causados por outras condições médicas, tais como:
- Hipóxia;
- Toxinas ou medicações;
- Causas desconhecidas.
Diagnóstico
- O diagnóstico é feito quando há amnésia ou hipomnésia (retrógrada ou anterógrada) que impacte significativamente o funcionamento social ou ocupacional do indivíduo, causada por uma condição médica geral.
- Pode ser transiente ou crônica.
Características clínicas e subtipos
- A memória recente está normalmente afetada, podendo levar a desorientação. Normalmente, a memória de mais longo prazo e a memória imediata permanecem intactos.
- Pode haver melhora clínica da amnésia anterógrada.
- O estabelecimento de sintomas pode ser súbito ou gradual.
- Em caso de acometimento de múltiplas funções cognitivas, um diagnóstico de demência ou delirium é mais adequado. Mas mesmo o quadro amnésico pode causar alterações (sutis ou grosseiras) de personalidade, confusão, e perda de consciência de morbidade.
Doenças cerebrovasculares
- Infartos do hipocampo normalmente estendem-se aos lobos occipital e parietal, caracterizando amnésia acompanhada de sinais neurológicos vocais envolvendo visão e modalidades sensoriais.
- Doenças vasculares afetando o tálamo bilateral medial estão relacionados a transtornos amnésicos.
Esclerose múltipla
A formação de placas no parênquima cerebral na esclerose múltipla pode afetar a memória caso ocorra no lobo temporal e na região diencefálica.
Síndrome de Korsakoff
- Síndrome amnésica causada por deficiência de tiamina, associada principalmente aos hábitos nutricionais de pessoas com problemas crônicos de uso de álcool.
- Neuropatologia inclui hiperplasia de pequenos vasos sanguíneos com hemorragia ocasionais, hipertrofia de astrócitos, e mudanças sutis de axônios.
- Associada também a mudanças de personalidade (baixa iniciativa, espontaneidade diminuída, desinteresse, despreocupação), relacionadas à deterioração do lobo frontal. Pacientes também apresentam confabulação.
- Estabelecimento da síndrome tende a ser gradual, com a memória recente mais afetada que a de longo prazo.
- Com tratamento, o quadro clínico pode melhorar, exceto em pacientes com comprometimento severo.
Blackouts alcoólicos
O consumo abusivo de álcool pode estar associado a amnésia episódica do período de abuso.
Terapia eletroconvulsiva (TEC)
- A TEC causa amnésia retrógrada para minutos anteriores ao tratamento e amnésia anterógrada após o tratamento, que se resolve em cerca de 5 horas.
- Pequenos défices podem permanecer por 1-2 meses, e se resolvem inteiramente em 6-9 meses.
TCE
- Pode haver amnésia retrógrada dos eventos que levaram ao TCE e do incidente em si.
- A severidade do trauma é vagamente correlacionada à duração da amnésia, mas o melhor fator para bom prognóstico é o grau de melhora clínica da amnésia durante a primeira semana após o paciente recobrar a consciência.
Amnésia transiente global
- É a perda abrupta da habilidade de lembrar de eventos recentes ou de novas informações.
- A síndrome inclui confusão, inconsciência de morbidade, sensopercepção preservada, e, ocasionalmente, inabilidade de performar tarefas complexas.
- Episódios duram entre 6 e 24 horas, e os pacientes tendem a se recuperar, embora possam ter recidivas.
- A fisiopatologia é desconhecida, mas provavelmente envolve isquemia do lobo temporal e do diencéfalo.
Patologia e exames laboratoriais
Testes neuropsicológicos quantitativos podem auxiliar no diagnóstico. Para além disso, nenhum exame laboratorial ou de imagem detecta características diagnósticas.
Diagnóstico diferencial
Doença de Alzheimer e delirium
- Amnésias, ao contrário do delirium, ocorrem com preservação da consciência.
- Ao contrário da doença de Alzheimer, transtornos amnésicos têm curso estático
- Transtornos amnésicos não afetam, como o Alzheimer, outras funções cognitivas.
Envelhecimento normal
Embora o envelhecimento normal possa acometer a memória, o diagnóstico de transtorno amnésico requer acometimento significativo do funcionamento do indivíduo.
Transtornos dissociativos
- Pacientes de transtornos dissociativos têm maiores chances de acometimento da consciência do eu, e tendem a ter défices mnêmicos mais seletivos que pacientes com transtornos amnésicos.
- Transtornos dissociativos estão frequentemente associados a eventos de vida estressantes.
Transtornos factícios
Resultados em testes de memória de pacientes simuladores são inconsistentes, e não há uma causa identificável para a amnésia.
Curso e prognóstico
- O curso depende da etiologia e do tratamento, especialmente do agudo.
- O acometimento pode não melhorar, mas raramente há progressão do transtorno.
Tratamento
O tratamento consiste primariamente na identificação e tratamento da causa subjacente. Todavia, o paciente pode receber suporte para lidar com datas, localizações, etc, e psicoterapia após sua melhora para lidar com o trauma emocional relacionado a um episódio amnésico.
Etiologia
O transtorno está normalmente relacionado a dano bilateral a estruturas como o diencéfalo, o tálamo, o hipocampo, os corpos mamilares, e a amnésia. Quando o dano é unilateral, o hemisfério esquerdo tende a ser o acometido.
Comprometimento cognitivo leve
Descreve uma forma menos severa de demência, em que há preservação das atividades de vida diária (algo controverso, visto que o comprometimento funcional é um critério “padrão” das nosologias psiquiátricas).
Apresentação clínica
É necessário que haja comprometimento de memória para firmar o diagnóstico, mas há controvérsia se ele deve ser validado por testes ou por reclamações subjetivas. No futuro, é provável que exames laboratoriais e de imagem sejam importantes para clarificar o diagnóstico, e estabelecer pontos de corte entre o declínio cognitivo esperado para o envelhecimento, o comprometimento cognitivo leve, e a demência.
Curso e prognóstico
Alguns pacientes podem retornar ao normal ou evoluir para demências, variabilidade que é explicada também pela diferença nos pontos de corte diagnósticos empregados.
Tratamento
- A identificação precoce de comprometimento cognitivo é importante para remoção de causas reversíveis.
- Programas de treinamento cognitivo podem auxiliar na compensação dos défices, e o controle de fatores de risco (hipertensão, hipercolesterolemia, diabetes melito) pode evitar progressão para demência.
Referência(s)
BOLAND, Robert; VERDUIN, Marcia L.. Kaplan & Sadock’s Synopsis of Psychiatry, 12. ed. Philadelphia: Wolters Kluwer, 2022.
1Anexo: fatores precipitantes e predisponentes de delirium.
2Anexo: mais informações sobre o diagnóstico diferencial.